terça-feira, 9 de dezembro de 2008

FORMOL



FORMOL


Formaldeído ou Metanal – H2C0

LEMBRANÇAS DE UM NERD ENQUANTO JOVEM

Fui um garotinho nerd com gosto por química. Meu primeiro Kit de laboratório era um brinquedo que ganhei, mas que nunca vi para comprar. Ele trouxe à tona algo que estava latente, pois estudava química muito antes de entrar no colégio, onde desenvolvi meu próprio método de cálculo estequiométrico reconhecido pelo mesmo professor de química “alquimista” e cabalista que me acompanhou desde a quinta-série. Um sujeito enorme que despertou meu apetite inicial por pesquisar ciências e aliviou muito meu gosto por dinossauros, armas (tinha militares na família e na vizinhança), ocultismo, religiões e música (ahh... nem tanto).

Deste pequeno kit desdobrou-se um problema quando acabaram os reagentes que o compunham. Mas isto por si só gerou outro brinquedo ainda mais divertido através de outra compreensão do cotidiano. Descobri com o tempo que todas as coisas são compostas de substâncias químicas. Mesmo, pode zombar de mim, mas isto não é tão banal quanto parece, Podemos perceber estas coisas, mas compreender, isto é, quando “cai a ficha” efetivamente, como quando as pessoas se emancipam no analista, é muito diferente do que quando informam a você as coisas através da TV e do Wikipédia, não que os negue, longe disso. A TV antes disto me educava pela anestesia, como muitas crianças que só tem isto e o futebol de rua além dos brinquedos entre crianças, igualmente mediados pela violência como brincar de polícia e ladrão ou arrouxeadoras guerras de estilingue com sementes de mamona...

Enfim, tudo começa do mais simplesmente observável, como na química é a titulação ácido-base com indicadores de mudança de pH. A partir disto, descobri, para minha alegria que as substâncias alcalinas poderiam ser cedidas pelo amoníaco dos vendedores de desinfetantes de rua, nestes caminhões que passam por aí, e o Lacto-purga continha em sua fórmula o precioso indicador fenolftaleína, que mostrava a presença de bases deixando-a da cor vermelha, bastava moer o comprimido com álcool que este diluiria a fenolftaleína enquanto coagulava a lactose, e depois filtrá-la com um coador de papel para café e utilizá-lo.

Resumindo aos leigos, poderia fazer o tal “sangue-do-diabo”, isto é, irritar as pessoas deixando-as desesperadas com a roupa manchada de vermelho até que a acidez da tinta das camisas neutralize a alcalinidade do amoníaco deixando-a novamente transparente, enfim, parte da vingança dos nerds, mas que só dura uma vez.

Mais tarde descobri no laboratório do colégio técnico um segundo efeito da fenolftaleína daí derivado. Nós que fazíamos estágio às sextas-feiras à tarde, perguntávamos a nós mesmos: “- Se a fenolftaleína é a substância que causa o efeito laxante do Lacto-Purga quando diluído, o que causaria aquele frasco que tínhamos à nossa frente, puríssimo?”

E assim, na outra semana realizamos a experiência ao colocar a fenolftaleína nos frascos de catchup e mostrada da caríssima e única cantina do colégio, esperando posteriormente na sala de aula para verificar os resultados. Neste sentido, o congestionamento do banheiro e as pessoas faltantes em sala denotavam que nossa experiência teve resultado positivo.

FORMOL, FALSAS PRIMEIRAS IMPRESSÕES

Outra história diferente foi a descoberta do formol. Com esta substância fiz um insetário (mas não só insetos, sejamos justos aos pequenos crustáceos e miriápodes) ao injetá-la nos pequenos bichinhos. A praia então dava margem a explorações muito complexas. Estes pequenos bichinhos foram sistematicamente anestesiados e ressecados com uma mistura ideal, aliás, vi estes dias um site perfeito sobre isto que me poupa ficar dando estes detalhes sórdidos de necrozoofilia.

Imaginava que a função social do formol é preservar como vivas as coisas mortas que já foram vivas como os fetos em frascos de formol.

Foi assim a segunda vez que vi esta substância com cadáveres em catacumbas na Faculdade de Medicina de Jundiaí, onde sempre me comoveu o sadismo dos estudantes de medicina ao mostrar seu laboratório de anatomia cujo princípio incorporávamos e transmitíamos a nossas colegas de ginásio, assustando-as. Em momento de desafio, cheguei a colocar o dedo no olho de um cadáver imerso num gigantesco tanque de formol até sair o humor aquoso, Neste tanque estavam também alguns órgãos como que desfiados pelo tempo de imersão, posteriormente lembrei deste aspecto graças à tentativa de deixar um figo envelhecer numa garrafa de cachaça.
Era o primeiro ambiente impregnado de formol que conheci.

Pulemos esta fase, o fato é que também descobri o efeito lacrimogêneo do formol, o que me trouxe certa paz momentânea, é claro, quando usado em outros valentões por exemplo.
Eu era um menino mais novo em relação à geração que contornava minha nova casa entre a classe média e que, salvo engano, viviam bem melhor que minha família, recém egressa da bocada.

QUÍMICA DE GENTE GRANDE

É estranho lembrar disso, mas a indústria química sempre me atraiu quando a via ao longo da estrada no caminho para a casa de minha avó no parque industrial químico entre Jundiaí e Cabreúva. Era estranho observar a complexidade daquelas estruturas futurísticas.

Pois um dia no futuro estava eu lá, numa destas fábricas que sempre admirei ao fazer em escala aquilo que eu fazia em pequena dimensão, gigantescos cilindros no lugar de meus pequenos beckeres, buretas e tubos de ensaio.

Algo da técnica e da capacidade constituída pelo homem um dia realmente me encantou, Mesmo tendo passado pelas estranhas experiências que passei em meu emprego anterior, me descobri novamente desejando não só dinheiro, mas tentando desta vez um novo emprego num lugar, a meu ver, menos inseguro, digo, algo em que talvez não me sentisse destruindo o mundo aos poucos e com o potencial infernal de transformar a região em que trabalhava numa Chernobyll. Mais preciso seria dizer como Bhopal, na Índia, muito mostrada em nossos vídeos de treinamento onde a fábrica da Union Carbide na manhã de 3 de dezembro de 1984 despejou 42 toneladas do gás metil isocianeto que matou 3.000 pessoas imediatamente, 8.000 em duas semanas e 8.000 de doenças derivadas no período posterior, com contribuição também da Dow Chemicals, criadora da Naphalm e outras coisas.

Nada com indústrias químicas foi pior que aquilo, execeto se acontecesse na fábrica onde trabalhava anteriormente, pois a empresa em que trabalhei era muitíssimas vezes mais perigosa, pois lidávamos com Tricloreto de Arsênio ao lado de uma plantação de morangos ao qual voltarei em breve. Digamos que nenhum lugar do mundo a aceitou, só o Brasil (na época FHC, mas acho hoje que qualquer um) e nenhuma cidade do país, excetuando Itupeva, no interior do estado de São Paulo ao lado de fábricas clandestinas de combustível, indústrias de gases industriais altamente explosivas, enfim, o lugar merece toda uma atenção particular foi onde mais passei meu tempo de pião de fábrica. Sempre com muito medo, pois tudo podia acontecer.

Ao entrar na última empresa química que trabalhei, a Elfo Autoquímico (nomes de fantasia, hoje é de outra empresa, a Santo Gabão), achei muito bonita pelo seu exterior, apesar de nada comparada à multimilionária e futurística empresa em que trabalhei antes. Tanta era a simplicidade e não racionalização completa dos processos, talvez pela muito mais baixa periculosidade aparente de seus produtos ou pelo baixo valor agregado, entre os quais solventes e resinas. Fui designado para o setor de utilidades industriais e ... Formol.

PEÃO QUÍMICO

Nada poderia dar sinais mais amistosos de tranqüilidade e menor periculosidade que seu refeitório, mais simples e tranqüilo, além do cartão Hollerith eletro-mecânico e não digital (falarei um dia deste interessante dispositivo de controle de tempo).

Me explico, em meu emprego anterior, antes de quase iniciarmos uma rebelião por esta causa, tínhamos que, após banho de descontaminação, nos vestir com um uniforme branco, de cor diferente da utilizada no trabalho, o que nos demarcava no refeitório como um campo de concentração. A comida era boa o suficiente, mas o executivo comia a La carte, qualquer coisa que pedisse, em mesas demarcadamente isoladas, aliás, esta era a função do uniforme: os trabalhadores da planta não podíam se misturar com o administrativo, isto é, deviam ser discriminados social e espacialmente.

Tudo mudou, talvez graças à leva de estagiários em engenharia química da UNICAMP que desrespeitava esta diretiva - que mais à frente talvez merecessem um capítulo à parte - mas o fato é que era difícil categorizar o papel de outros dois sujeitos, o engenheiro, pois, se ele também está na planta, porquê ele pode utilizar suas roupas normais, junto com o supervisor (ou capataz, entre nós, por cumprir analogamente a mesma função), pois também não estavam até então conosco na planta? Enfim, nada disto havia entre os franceses, diferentes dos flamengo-americanos, os anteriores proprietários de minha força de trabalho.

Não agüentava mais ver formol, isto é fato, ele entrava como metanol e se tornava formol através de gigantescos reatores com eletrodos de prata puríssima, para depois, abastecemos os caminhões-tanque de formol. Caminhava sempre por cima deles e despejava o formol operando gigantesca tubulação de alumínio até visualizar a marca que definia a quantidade indicada. O problema é que um caminhão tanque era observado de cima pelo operador com o tanque de alumínio quentíssimo em dias de sol após transitar por longas estradas. Ao verter o formol este evaporava imediatamente como um gás lacrimogêneo nos fazendo arder as mucosas. E como ardiam! E como chorei mecânica e copiosamente... Se pusesse máscara não veria o nível devido ao gás que embaçava e se transbordasse, bronca. A única forma era tentar visualizar, choroso, à olho nu. Agora, se perguntar nos manuais, ou inquirir o capataz, nada disto seria dito. Tudo isto conseguia ser imposto sem se obrigar diretamente pela fala, o que seria assumir uma irregularidade, uma ação ilegal.

FENOL

A primeira impressão positiva passou muito rapidamente, pois nunca havia comido num lugar que desse tamanha impressão de tristeza. Vi outros ex-trabalhadores da Acaso Móvel (fui recomendado a usar nomes de fantasia) presentes, mas nenhum deles brincava ou tinha um sentido de comunidade, ali era demarcada a indiferença conosco, não estávamos lá como trabalhadores braçais especialistas, mas como trabalhadores braçais somente.

Reconheci um dia uma cara conhecida no refeitório e depois no almoxarifado indo pegar peças e equipamentos de proteção individual. Via muito pouco as pessoas do administrativo ou do laboratório, pois mesmo trabalhando em três turnos revezados, entrava muito mais cedo que o administrativo e almoçava mais cedo também, no entanto, eis que reconheci o garoto muito jovem que estava lá e que fora amigo de meu irmão mais novo na escola. Parecia trabalhar naquele lugar com muito orgulho, assim como seu pai.

Seu pai era um caso típico, ele se esforçou para pagar o colégio técnico em química do filho em escola particular, que talvez até tivesse o mesmo ímpeto pelas ciências, quem sabe, o fato é que seu pai, para isso, teve de trabalhar muito e fazer muitas horas extras, mas agora já não poderia mais custear seu filho, o que achei tranqüilo, pois nunca tive escola particular ou o que seja, no entanto, o fato é que hoje ele, antigo trabalhador do setor de resinas, aposentou-se por invalidez, após oito anos de trabalho, a média do setor e hoje respira por um tubo no nariz, pois precisava utilizar a boca para cuspir sangue.

O jovem de pele morena e meio gordinho, sempre tido como um tipo pouco esperto entre os outros garotos cheios de malandragens era muito hostilizado, digo, meio lerdinho. No entanto, sabia de seu provável destino e se encaminhava pacientemente para ele, eu não sabia se por um tipo de estoicismo, um comportamento maníaco ou por estar preso àquelas referências. O fato é que eu me achava muito mais esperto por ter sido formado num curso público em saneamento ambiental e trabalhar em formol e utilidades industriais, como tratamento de água, efluente (o que vai, esgoto) e caldeiras e não no setor de resinas fenólicas.

Aquele lugar era deprimente, avermelhado e com máquinas que emanavam pó por toda parte, um pó tóxico e perigoso que o tempo todo caía em flocos, e tornava a superfície daquela caixa gigante como se fosse de pelúcia. Os uniformes ficavam avermelhados e imaginava que dificilmente haveria uma técnica para tirar os equipamentos de proteção individual sem se contaminar com Fenol.

Ora, se até aquele momento, lembrava dos anéis aromáticos do fenol, foi com carinho e respeito, como numa daquelas aulas de química orgânica em que dava muita atenção no colégio técnico onde foi citado o conceito de que suas ligações eram simultaneamente duplas e simples num paradoxo quântico, no entanto, ninguém havia me preparado para aquilo.

AS IMPRESSÕES EVAPORAM

Sair de lá era muito aliviante, pois os vãos não protegidos do uniforme coçavam sem parar. Aquelas pessoas ficavam lá enchendo sacos e sacos daquilo e achei interessante o único mecanismo moderno que tecnologicamente parecia substituir parte do sofrimento por esforço físico repetitivo em algo mais eletromecânico, o que pareceria um uso inteligente da tecnologia. A grua permitia gigantesco esforço físico, no entanto, forçava o ritmo e a dor da repetição constante dos movimentos o que tornava aquela sala funcional dia e noite em um gigantesco comportamento maníaco e acelerado para produzir resina fenólica. Este pó que pinicava entre a face e a máscara de sólidos que os protegia pelos oito anos que durava seu período útil, me assustava pelo seu aspecto. No entanto, de tudo isto resultava a resina fenol e formaldeído que constituía os móveis mais usuais à nossa volta.

Ritmo e produção, eficácia e lucro calculado em termos de produção contínua e homens continuamente produzindo, afastamento e acidentes são calculados numa relação custo x benefício. Quantas pessoas se acidentam e quantos processam? Quantos dias de trabalho perdido, única moeda de troca que envolve a saúde do trabalhador como pressuposto. Ou seria só porque era garantido que ela sacrificaria a produtividade?

Para quem não sabe o que é resina fenólica, ela é a base daquilo que forma os compensados dos móveis vendidos tão barato sob financiamento que estes mesmos homens compravam. Eu me sentia feliz de não trabalhar ali, mas era uma felicidade mais que duvidosa, talvez relacionada à uma sensação maior de controle das máquinas e equipamentos e a um tempo mais auto-organizado no ar livre, pois as máquinas que controlava diretamente diziam respeito ao consumo de matérias primas e entre elas o vapor e as matérias primas orgânicas, os líquidos que fazíamos reagir para produzir outros líquidos e sólidos. Transmutação constante da alquimia da fábrica.

Vi coisas interessantes como a uréia pura que em contato com a água gelava dando a temperatura que permitia saber sua pureza. Imaginei como levar uréia para o mato, fazendo gelar coisas quando acampava.

Também me era interessante a transmutação do metanol em formol. O incômodo de participar deste processo era que para trabalhar com este calor e estas substâncias, usava coturnos de metal que entortavam e faziam doer meus dedões, muito os amaldiçoei, pois meus pés são grandes e naquelas botinas ficavam ainda mais desajeitados, outro incômodo destes equipamentos que me protegiam era o suor dado o calor que me causavam e que, por sua vez, causava bolhas e cortes e, quando em contato com o formol, ardiam muito. Do mesmo modo as pesadas máscaras faciais Dräger faziam-nos suar muito mais ainda.

O MOTIVO DE TUDO

Meus pais não tinham idéia do mundo em que eu vivia, nas oito horas em que passava nestes locais e sempre zombavam de minhas reclamações me dizendo muito delicado e fresco. Meu pai era um filho de militar, minha mãe, de camponeses numa grande família em que eram todos mão de obra não remunerada. Tanto trabalho que teve como colhedora e plantadora não lhe deram qualquer aversão ao trabalho, especialmente porquê quando teve filhos este lhe foi vetado pelos meus avós, o que a deixou muito ressentida conosco.

Todos achavam que o importante era o dinheiro que trazia, e ainda morava com eles e aproveitava o relativo grau de liberdade que me permitia o assalariamento.

Meus amigos eram ligados a mim desde antes, no interior se é amigo de quem não se tem afinidades, mas que se cresceu junto. No entanto, demandam presença, justamente o que me era impossível. Após isto, só pude construir relações de afinidade ou paquerar garotas após assalariamento, neste grau de liberdade permitido pelo consumo, no entanto, o fato de eu trabalhar em turnos com folgas variadas que não caíam no fim de semana, me distanciavam de meus antigos colegas me ligando a outros.

Quando finalmente consegui ter dinheiro para ir para os shows de bandas interessantes do nascente cenário de rock alternativo da época me vi distanciado das datas. Meus turnos eram das seis da manhã às duas da tarde por cinco dias, folga de cinco dias, das duas as dez durante cinco dias, folga de dois dias, das dez às seis durante cinco dias, folga de três dias.

Acreditem ou não raras vezes coincidia com o fim de semana, o que, no interior, me fazia distante dos horários de lazer de meus outros amigos, ocupados em sub-empregos urbanos e tentando passar no vestibular, um ou outro metalúrgico, segurança, ou universitários. Normalmente, para acompanhá-los eu sacrificava meu sono em dias que iria trabalhar direto de manhã, ou outros, afinal a pouca idade permite coisas incríveis e saídos do colégio, achamos que podemos tudo.

Eu achava muito injusto aquele mundo, é claro, vindo já de formação política incipiente, sentia como se o tempo fosse roubado, e este era o preço de poder viver razoavelmente bem, como dizia uma moça que fiquei na época e que havia sido por um tempo prostituta e posteriormente voltou a ser sem que as outras pessoas com quem convivesse soubessem ou fossem ligadas a este mundo: “viver na classe média tem um preço diferente para cada pessoa”.

O caminho do excesso era o que parecia razoável quando entrava no fim de semana, e tive experiências fortes com o que pudesse me aliviar, falemos disto noutro local, sobre o que alivia a tragédia dos sentidos e que sempre achei algo bem ligado ao trabalho. Manter o ritmo da produção e da vida externa à fábrica para alguém mais velho exigia muito e por isto via muitos usuários de drogas, algo sem dúvida, no caso dos estimulantes, ligado à atenção necessária para o trabalho à noite.

RELIGIÃO DO TRABALHO

Outros, muito puros, não usavam, como um mineiro muito esforçado e religioso do trabalho, destes que mesmo sem fé acreditavam numa redenção moral pelo trabalho.

Estava passando no ponto de descarga de uréia e ouvi um gemido. Após esse som, ouvi um pedido de socorro abafado, quando vi, notei que era o mineirinho atleticano caído sem se mexer como uma tartaruga virada de casco para baixo, fui até ele e o tirei de lá.

No ápice de um pico de produtividade ele estava lá em seu esforço hercúleo por algum bem etéreo, pois seu salário era como o dos demais, mas diríamos que seu emprego seria mais estável neste período, o que também é incerto, mas o fato é que acreditava no que fazia até que caiu um dia no chão com a coluna travada. Seria apenas um descanso forçado pelo corpo exausto não fosse ao lado de um ponto de descarga de vapor que diluiria a uréia.

Se não o tirasse de lá partes suas com certeza se diluiriam na uréia. Ele nunca parou de se esforçar tanto quanto sempre o fez. Aquilo não significou nada para ele.

Lembro que sempre brigou comigo, pois eu nunca “vestia a camisa da empresa”, talvez tenha ouvido sobre a tentativa incipiente de tentar levantar o sindicato contra a gestão vigente que participou do “acordo” na empresa anterior que acabou resultando na demissão de metade de todo o setor de produção da fábrica. A tentativa acabou mal, com demitidos e ameaças de morte, consegui, por ser novato e ter bons conhecimentos de processos uma indicação que me valeu aquele emprego, o que me foi útil depois da tentativa infrutífera de começar meu primeiro curso de graduação. Mas pensando bem, talvez ele não tenha ouvido falar de nada daquilo.

O fato é que eu continuava preso àquele cotidiano macabro, afinal, as senhoras querendo mudar seus cabelos continuaram a fazer escova progressiva com formaldeído, assim como os móveis de compensado continuam a constituir os ambientes domésticos das famílias de baixa renda.

No entanto, nada disto me importava, pois tudo parecia dar errado na minha vida naquele momento e o formol me ardia nas narinas.

3 comentários:

Unknown disse...

Boa Noite! Muito interessante a sua narrativa. Como já faz muito tempo que não tenho contato com química preciso de uma ajuda. Aonde posso encontrar compostos aldeídos menos voláteis que o formol? Obrigado.

Aliado D. disse...

Acredito que o proprio formol possa formar para-formol que, no caso, se tornaria solido.

Vinicius Marques disse...

hahahaha colocar no catchup foi golpe de mestre. Nobel de traquinagem pra vcs, rs.